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10.3.10

Ex-Skinhead se Torna Ortodoxo


VARSÓVIA - Quando Pawel se olha no espelho, ele ainda pode ver, por vezes, um skinhead neonazista olhando de volta para ele, o homem que ele foi antes que cobrisse a cabeça raspada com uma ‘kipá’, trocasse sua ideologia fascista pela Toráh e renunciasse à violência e ao ódio para se dedicar a D’us.
"Eu ainda luto todos os dias para descartar as minhas idéias do passado" disse Pawel, um jovem de 33 anos ultra-ortodoxo judeu e ex-motorista de caminhão, observando com um pouco de ironia que ele teve que parar de odiar os judeus, a fim de que pudesse se tornasse um. "Quando olho para velhas fotografias quando era um skinhead, eu sinto vergonha. Todo dia eu tento fazer a ‘teshuvá’", disse ele, usando a palavra em hebraico para significar arrependimento. "Em cada minuto de cada dia, há muito ainda por fazer". Pawel, que também usa o nome hebraico de Pinchas, pediu que o seu sobrenome não fosse divulgado por temer que seus ex-amigos neonazistas poderiam prejudicá-lo ou a sua família.

Vinte anos depois da queda do comunismo Pawel é talvez o exemplo mais improvável do renascimento judaico que está acontecendo na Polônia; um momento em que os líderes judeus locais dizem que o país está finalmente demonstrando que está abandonando o anti-semitismo raivoso do passado. Antes de 1939 a Polônia era o lar de mais de três milhões de judeus, e que mais de 90 por cento deles foram mortos pelos nazistas. A maioria dos que sobreviveram emigraram. Menos de 50.000 permaneceram na Polônia, e muitos abandonaram ou esconderam o seu judaísmo durante as décadas de opressão comunista quando a política dos pogroms contra os judeus persistiu.

Hoje, porém, Michael Schudrich que é o rabino-chefe da Polônia, disse que considera a Polônia o país mais pró-Israel na União Européia. Ele disse que a atitude de Papa João Paulo II, um polonês, que chamou os judeus de "nossos irmãos mais velhos" finalmente penetrou na consciência pública. Dez anos depois que foi revelado que 1.600 judeus da cidade de Jedwabne foram queimados vivos por seus vizinhos poloneses em julho de 1941, ele disse que o mito nacional de que todos os poloneses foram vítimas da Segunda Guerra Mundial havia finalmente sido destruído.

"Antes de 1989 havia um receio que não era seguro de dizer 'Eu sou judeu'" disse o rabino Schudrich. "Mas duas décadas depois, há um crescente sentimento de que os judeus são uma parte que falta na Polônia. O nível de anti-semitismo continua a ser inaceitável, mas a imagem dos poloneses assassinos gravada na consciência de muitos judeus depois da guerra não corresponde à da Polônia de 2010". O pequeno renascimento judeu está em desenvolvimento há vários anos na Europa Oriental. Centenas de poloneses, a maioria deles criados como católicos, está se convertendo ao judaísmo ou descobrindo as suas raízes judaicas que por décadas estavam submersas como conseqüência da II Guerra Mundial.

Nos últimos cinco anos a comunidade judaica de Varsóvia cresceu de 250 famílias para 600. Os cafés e bares do antigo bairro judeu na Cracóvia estão lotados de jovens judeus convertidos que ouvem a música hip hop israelense. Michal Pirog, um conhecido artista da TV e dançarino recentemente proclamou suas raízes judaicas em rede nacional de televisão, e disse que com sua revelação tinha conseguido mais fãs do que inimigos. "A Polônia está mudando" disse ele. "Eu sou judeu e eu me sinto bem" ressaltou.
A metamorfose de Pawel, um skinhead batizado católico para um judeu começou num bairro desolado (= triste) com prédios de concreto na Varsóvia na década de 1980, quando Pawel disse que ele e seus amigos reagiram à rígida uniformidade do socialismo abraçando o anti-semitismo. Eles rasparam suas cabeças, portavam facas e se cumprimentavam com o braço direito levantado na saudação nazista.

"Oy vey, eu odeio ter que admitir isso, mas gostávamos de espancar os judeus, árabes e pessoas sem teto" disse Pawel recentemente na Sinagoga Nozyk. "Nós cantávamos coisas burras como Satanás e sobre matar pessoas. Nós acreditamos que a Polônia deveria ser só para os poloneses". Ele lembrou que num dia ele e seus amigos faltaram na escola e pegaram um trem para Auschwitz, o campo de extermínio nazista que fica perto da Cracóvia. "Nós fizemos piadas que queríamos que a exposição pudesse ser muito maior e que os nazistas deveriam ter matado ainda mais judeus" disse ele. Mesmo quando Pawel assumiu a identidade de um neonazista, ele disse que tinha dúvidas cruéis que sua identidade estava construída sobre uma mentira. O seu pai que frequentava a igreja sempre que podia citava o Antigo Testamento. O seu avô forneceu pistas sobre os segredos do passado da família. "Uma vez, quando eu disse ao meu avô que os judeus eram maus, ele explodiu e gritou para mim: "Se você repetir uma coisa dessas de novo debaixo do meu telhado, você nunca mais vai poder voltar à minha casa!".

Com 18 anos Pawel ingressou no exército e se casou com uma companheira skinhead. Mas a consciência sobre si mesmo mudou irrevogavelmente na idade de 22 anos, quando sua esposa, Paulina, suspeitando que ela tivesse raízes judaicas, consultou um instituto sobre genealogia e descobriu na Varsóvia registros como judeus dos avôs maternos de Pawel e assim como de seus próprios avôs. Quando Pawel confrontou seus pais, disse ele, eles começaram a chorar e lhe disseram a verdade: sua avó materna era judia e tinha sobrevivido à guerra ficando escondida em um monastério por um grupo de freiras. Seu avô paterno, que também era judeu, tinha sete irmãos e irmãs, e que a maioria deles morreu no Holocausto. "E eu disse para os meus pais: 'Que diabos? Imagine, eu era um neonazista e agora fico sabendo disso? Eu não consegui me olhar no espelho por semanas" disse ele. "Meus pais eram descendentes típicos de judeus sobreviventes da guerra, que decidiram esconder a sua identidade judaica para tentar proteger as suas famílias".

Abalado por essa descoberta, Pawel disse que passou semanas em torturante reflexão, mas que finalmente foi superada por um forte desejo de se tornar judeu, até mesmo um ortodoxo. Ele reconheceu que tinha tendência para os extremos. Disse que sua transformação foi árdua, semelhante a um renascer. Ele mesmo se obrigou a reler o "Mein Kampf", mas não conseguiu chegar ao fim porque sentiu uma grande repulsa física. "Quando perguntei a um rabino, 'Por que me sinto assim?" ele respondeu: "As almas dormentes dos seus antepassados estão chamando por você". Aos 24 anos ele foi circuncidado. Dois anos depois ele decidiu se tornar um judeu ultra-ortodoxo. Ele e sua esposa estão criando os seus dois filhos num lar judaico.

Pawel ressalta que ele ainda é notado pelos mesmos anti-semitas, que antes o tinham no seu grupo. "Quando jovens me vêem na rua com o meu chapéu e meus cachos, às vezes riem de mim" disse ele. "Mas são as senhoras de idade que são as mais malvadas. Às vezes elas usam palavras que eu usava quando era um skinhead: “Vá embora e volte para o seu país” ou “Judeu, vá para a sua casa!".

E atualmente ele está estudando para se tornar um shochet, uma pessoa que tem a responsabilidade de matar animais de acordo com as leis dietéticas judaicas. "Eu sou bom com facas" ele explicou.


Um comentário:

  1. A quase totalidade da família do meu bisavô era da Polônia e foram mortos pelos porcos nazistas. A propósito: é bom ver alguns patrícios reconhecendo a própria identidade judaica e resistindo aos males da assimilação.

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